quinta-feira, 3 de novembro de 2011

curso de atualização em direito das sucessões ESA - sucessão do companheiro

Medida cautelar. Atribuição de efeito suspensivo a recurso especial.
Inventário. De cujus que, após o falecimento de sua esposa, com quem tivera uma filha, vivia, em união estável, há mais de trinta anos com sua companheira, sem contrair matrimônio. Incidência, quanto à vocação hereditária, da regra do art. 1.790 do CC/02. Alegação, pela filha, de que a regra é mais favorável para a convivente que a norma do art. 1829, I, do CC/02, que incidiria caso o falecido e sua companheira tivessem se casado pelo regime da comunhão parcial.
Afirmação de que a Lei não pode privilegiar a união estável, em detrimento do casamento. Medida liminar parcialmente deferida, apenas para determinar a partilha, no inventário, da parcela incontroversa do patrimônio, promovendo-se reserva de bens.
- O art. 1.790 do CC/02, que regula a sucessão do 'de cujus' que vivia em união estável com sua companheira, estabelece que esta concorre com os filhos daquele na herança, calculada sobre todo o patrimônio adquirido pelo falecido durante a convivência. Trata-se de regra oposta à do art. 1.829 do CC/02, que, para a hipótese de ter havido casamento pela comunhão parcial entre o 'de cujus' e a companheira, estabelece que a herança do cônjuge incida apenas sobre os bens particulares.
- A diferença nas regras adotadas pelo código para um e outro regime gera profundas discrepâncias, chegando a criar situações em que, do ponto de vista do direito das sucessões, é mais vantajoso não se casar.
- A discussão quanto à legalidade da referida diferença é profundamente relevante, de modo que se justifica o deferimento da medida liminar pleiteada em ação cautelar, para o fim de reservar os bens controvertidos no inventário 'sub judice', admitindo-se a partilha apenas dos incontroversos.
Medida liminar parcialmente deferida.
(MC 14.509/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/08/2008, DJe 05/09/2008)


RECURSO ESPECIAL Nº 1.195.555 - SP (2010/0096481-8)
RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETI
RECORRENTE : LEONOR MARQUEZINI - ESPÓLIO
REPR. POR : DOLORES MARQUEZINI PALMAS - INVENTARIANTE
ADVOGADO : SÍLVIO ROBERTO FERNANDES PETRICIONE E OUTRO(S)
RECORRIDO : ARMANDO CORBO
ADVOGADO : ADILSON AUGUSTO E OUTRO(S)
DECISÃO
1.- LEONOR MARQUEZINI - ESPÓLIO interpõe Recurso Especial com
fundamento no art. 105, inciso III, alíneas "a" e "c" da
Constituição Federal, contra Acórdão do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo (Rel. Des. TEIXEIRA LEITE), proferido nos
autos de ação de inventário, assim ementado (e-STJ fls. 321):
INVENTARIO. Sucessão do companheiro. Inconstitucionalidade do art
1790 III do CC/02. Falecida a companheira, sem deixar descendentes
ou ascendentes, herda com exclusividade seu companheiro.
Interpretação sistemática da atual ordem constitucional Art 1829 III
CC/02 c/c 226 CF. Falecido o companheiro-herdeiro no curso do
inventário, sucede-o seu filho, único herdeiro, ao qual devem ser
adjudicados todos os bens inventariados, em detrimento dos
colaterais da autora da herança. Recurso provido.
2.- O recorrente alega ofensa aos arts. 1.790, III, do Novo Código
Civil. Aponta divergência jurisprudencial.
Sustenta, em síntese, que os parentes colaterais são herdeiros
únicos dos bens particulares do de cujus e concorrem com o
companheiro para os bens adquiridos na constância da união.
3. - Contra-arrazoado (e-STJ fls. 417/422), o Recurso Especial
(e-STJ fls. 335/348) foi admitido (e-STJ fls. 424).
É o relatório.
4.- O tema já está pacificado pela jurisprudência desta Corte, de
modo que o recurso deve ser julgado monocraticamente pelo Relator,
segundo orientação firmada, com fundamento no art. 557 do CPC,
desnecessário, portanto, o envio às sobrecarregadas pautas de
julgamento deste Tribunal.
5.- Quanto aos direitos do companheiro à sucessão da de cujus, o
Tribunal de origem decidiu termos (e-STJ fls. 322/332):
Leonor Marquezini, com quem José Corbo, pai do agravante, viveu em
união estável por 20 anos, faleceu em 28.7.07 (fl. 43).
O inventário foi aberto pela irmã de Leonor, Dolores Marquezini
Palmas (fl. 41). José, companheiro reconhecido por sentença
transitada em julgado (fls. 205/208 e 238), habilitou-se, mas
faleceu logo em seguida, em 6.1.09. Segundo defende o agravante,
José, na qualidade de companheiro e inexistentes descendentes ou
ascendentes de Leonor, herdou com exclusividade os bens por ela
deixados. Entende, portanto, pela inconstitucionalidade do art. 1790
III do Código Civil, devendo a sucessão do companheiro seguir a
regra do art. 1829 III do Código Civil, sob pena de afronta à
igualdade de direitos atribuída pela Constituição Federal aos
cônjuges assim como aos companheiros (art. 226).
Nesse compasso, falecido José, deveria sucedê-lo o agravante, seu
único herdeiro, na totalidade da herança. A d. Magistrada entendeu
pela aplicabilidade do art. 1790 III do Código Civil, atribuindo ao
agravante apenas 1/3 da metade dos bens adquiridos onerosamente na
constância da união estável, porque concorre com as irmãs e
sobrinhos da falecida, os quais herdam, com exclusividade, os bens
particulares.
Pois bem. A respeito dessa matéria, este relator mudou recentemente
seu entendimento, passando a comungar da tese defendida pelo i.
Desembargador Francisco Loureiro, no sentido da
inconstitucionalidade do art. 1790 III do Código Civil, que retrata,
hoje, o pensamento uníssono desta Câmara:
"A questão envolve o exame da compatibilidade do art. 1.790 do
Código Civil com o sistema jurídico de proteção constitucional às
entidades familiares e o direito fundamental à herança. Não há por
isso como abordar o tema com visão simplista e exegética do texto da
lei, tirando os olhos dos valores constitucionais que iluminam todo
o sistema.
(...) citação doutrinária
O regime de bens de casamento assume uma função supletiva de
garantia do viúvo e, portanto, tem direta relação com a sua
participação na herança. Pode-se afirmar, em linha geral, que o que
procurou o legislador foi conferir ao cônjuge sobrevivente a posição
de herdeiro concorrente com a primeira classe, no que se refere aos
bens próprios, ou particulares do falecido, vale dizer, aqueles em
que o viúvo não figura como meeiro, com o objetivo de garantia de
seu bem estar.
(...)
Essa conclusão, a meu ver, não pode prevalecer, sob a ótica
civil-constitucional. Obvio que o casamento não se equipara à união
estável, podendo gerar - como gera - direitos e deveres distintos a
cônjuges e companheiros. O que se discute é a possibilidade da
legislação infraconstitucional alijar, de modo tão grave, alguns
direitos fundamentais anteriormente assegurados a partícipes de
entidades familiares constitucionalmente reconhecidas, em especial o
direito à herança.
(...)
Do corpo do julgado consta passagem que vem ao encontro do que acima
foi dito, ou seja, da impossibilidade de se alijar entidade de
estatura constitucional de direito fundamental — herança - sem a
criação de mecanismos compensatórios:
(...) .
Transportando esse entendimento para o caso concreto, falecida
Leonor Marquezini, sem deixar descendentes ou ascendentes, herdou
com exclusividade seu companheiro, José Corbo, tanto a meação
relativa aos bens adquiridos na constância da união estável, quanto
os bens particulares. E falecido ele, o único herdeiro da autora da
herança, deve sucedê-lo seu filho, ora agravante, seu único
herdeiro.
Assim, comporta deferimento o pedido formulado pelo agravante nos
autos do inventário, para se lhe deferir a adjudicação de todos os
bens inventariados.
De início, observa-se, que é inviável, em Recurso Especial, a
análise de suposta violação de dispositivo constitucional, sob pena
de se usurpar a competência do Supremo Tribunal Federal, nos termos
do art. 102 da Constituição Federal.
Verifica-se que o acórdão tem fundamento eminentemente
constitucional (art. 226 da Constituição Federal), o que inviabiliza
o exame do Recurso Especial, sob pena de usurpação da competência do
E. Pretório Excelso.
6.- Ante o exposto, nega-se seguimento ao Recurso Especial.
Intimem-se.
Brasília (DF), 22 de setembro de 2011.
MINISTRO SIDNEI BENETI
Relator
(Ministro SIDNEI BENETI, 30/09/2011)

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